Vida fácil na rua?

O que leva alguém a preferir ficar na rua do que em casa ou mesmo em um abrigo?

“Eles querem a vida fácil”, dizem algumas pessoas que torcem o nariz para as pessoas em situação de rua, como ouvimos recentemente da primeira dama de São Paulo, num vídeo que viralizou. Mas qual é a facilidade de estar totalmente exposto e vulnerável?

Esse julgamento é ainda mais enfático quando aqueles que têm essa opinião veem as pessoas dormindo na rua durante o dia. “Vagabundos”, muitos pensam. Mas não consideram que, sem ter um lugar seguro para dormir, não dá para repousar quando o medo de ser roubado, esfaqueado ou queimado vivo durante a noite não é um exagero, mas uma preocupação real.

Embaixo deste viaduto, na região central de São Paulo, um grupo de moradores de rua se abriga. Como uma forma de servir e amenizar essa situação, fazemos mutirões de limpeza. Na semana passada, ao atender o grupo que estava ali, descobrimos que muitos deles estavam com sarna. Compramos a medicação, limpamos o lugar, trocamos os cobertores e roupas deles.

“Estou cansado, tia. Usei droga a noite toda para a dor passar”. Isso não é conforto. Os meninos nos contam que não gostam de hospitais, porque muitas vezes são maltratados quando buscam socorro sozinhos. Alguns, inclusive, relatam terem sido amarrados quando foram internados.

Quando o próprio sistema parece fazer de tudo para acabar com a sua existência porque não vê você como um cidadão, mas como um problema, a quem se recorre?

É aqui que nós buscamos nos colocar: como um lugar seguro, com pessoas que querem estar perto deles nos momentos de necessidade e também nos de alegria. Ser gente de perto.

Convivemos com a falta de misericórdia neste mundo. A prática da empatia, uma palavra tão na moda nas redes sociais, ainda continua em falta.

Queremos ser aqueles que enxergam estes “zumbis” como o que eles realmente são: pessoas com histórias que não conhecemos individualmente, mas cujo final Deus quer mudar para melhor.

Ouvimos de uma criança recentemente que ela se considera um lixo. E está bem claro que esse pensamento não é fruto de uma imaginação fértil, mas sim reflexo do tratamento que lhe é dado constantemente. A invisibilidade, o medo e a agressão são responsáveis por isso. E é justamente esse pensamento que queremos mudar.

Como bem disse Edmund Burke: “Para que o mal triunfe basta que os bons não façam nada”. Por isso, precisamos ser luz neste mundo. Cada uma dessas pessoas é preciosa para Deus. E deve ser para nós também.

Quando publicamos nas redes sociais sobre a situação das crianças na rua, recebemos não só comentários perguntando sobre o que fazer, mas também pessoas que dizem já acompanhar o trabalho da ABBA indignadas com uma realidade de crianças na rua que elas não conheciam.  Muita gente quer logo mobilizar, militar e despertar a sociedade ou as autoridades. Isso tudo tem valor e lugar, mas não antes de um compromisso de empatia que se coloca do lado dessas pessoas, de se tornar gente de perto. Fica, então, um convite para um primeiro passo: conheça o trabalho da ABBA e se envolva.

Acolher para a vida

Ao olhar para a criação divina, é possível verificar que Deus criou as relações humanas de tal forma que a família é o lugar saudável onde uma criança deve estar para poder ser nutrida e educada, a fim de que possa crescer e se desenvolver como ser humano. A família humana não é algo aleatório, mas sim um reflexo daquilo que é a imagem e semelhança do próprio Deus. Todas as referências existentes na Bíblia que ilustram Deus como Pai e Jesus como Filho são evidências de que Deus criou a humanidade de forma a espelhar sua pessoa.

Como reflexo dessa realidade, é possível perceber na maternidade e paternidade uma das mais belas formas de se ver a imagem e a semelhança de Deus. Contudo, ser pai e mãe daqueles que são carne da sua carne não é exatamente o que Deus fez pela humanidade. Deus se tornou Pai daqueles que não são como ele é, assim como Jesus era, mas os adotou para que se tornassem como seu verdadeiro Filho (Romanos 8.29).

Um princípio nos escritos bíblicos, seja no Antigo ou no Novo Testamento, é que Deus inclui em sua família pessoas que antes estavam em situação de orfandade, abandono, solidão e até inimizade com ele. Um exemplo claro de Deus se identificando com órfãos e viúvas está em Salmos 68.5-6, que diz que Deus é o Pai que coloca o solitário em família. Vale refletir que ser salvo é ser adotado por Deus e entrar no relacionamento último e íntimo existente na própria Trindade.

O órfão sofre muitas injustiças pelo fato de estar fora do contexto familiar, mas o próprio Deus “faz justiça ao órfão e à viúva, e ama o estrangeiro, dando-lhe roupa e comida” (Deuteronômio 10.18). Por isso ele nos instrui: “Aprendam a fazer o bem! Busquem a justiça, acabem com a opressão. Lutem pelos direitos do órfão, defendam a causa da viúva” (Isaías 1.17).

Viver em família é o plano de Deus e, portanto, direito de toda criança e adolescente nessa terra. No entanto, milhões de crianças crescem sem o benefício de relacionamentos permanentes com adultos amorosos e carinhosos. Suas famílias foram desfeitas devido à pobreza, doença, morte, guerras, marginalização, violência, abuso e negligência.

Cristãos comprometidos com o Reino de Deus, coerentes com o evangelho, que desejam ardentemente ser relevantes nesta geração, têm o privilégio e a oportunidade de serem a encarnação do amor de Deus na transformação de histórias trágicas em histórias de amor por meio do acolhimento familiar, da adoção, do voluntariado, do suporte, do ofertar e de outras intervenções.

Afeto para avida

O desenvolvimento humano vai além de seu aspecto físico. Você sabia que somos os únicos seres que necessitam da afetividade para sobrevivência? Sim, para sobrevivência! Se um bebê tem todas as suas necessidades fisiológicas, como higiene e alimentação, supridas, mas sem uma relação mínimia de afeto e interação humana, ele poderá morrer. Nosso desenvolvimento humano, o que definirá nossa sobrevivência ou não, depende de relações afetivas. Uma criança que não é tocada, acariciada, que não é olhada nos olhos, ou a quem palavras carinhosas não são direcionadas, não se desenvolverá plenamente.

Essa relação entre afeto e desenvolvimento físico, cognitivo, emocional e social tem sido amplamente pesquisada nos últimos 60 anos. O que se sabe, certamente, é que a privação de relações afetivas e seguras, principalmente na primeira infância, acarretará em danos permanentes. Um dos pontos de grande discussão nessa área é o impacto desses danos para a sociedade. O impacto social de indivíduos que cresceram privados de relações afetivas seguras tem a ver com educação, saúde, economia e até segurança pública.

Podemos perceber, por exemplo, a atenção que empresas têm com a capacidade emocional de seus candidatos. Sendo a capacidade emocional intrínseca a cada ser humano, as questões técnicas podem ser aprendidas. Contudo, danos causados no âmbito emocional são questões dificilmente alteradas na vida adulta, o que pode afetar diretamente o ambiente de trabalho e torná-lo mais ou menos colaborativo e produtivo. Portanto, a vida afetiva e seu impacto se torna cada vez mais importante e real no mundo em que vivemos.

Essa é uma realidade universal que afeta cada um de nós, como seres humanos. Da mesma forma, a privação e a negligência de relações afetivas seguras pode estar presente em qualquer contexto. Tal negligência, portanto, pode acontecer no âmbito de uma família que atenda muito bem as questões materiais de um bebê. Para esses casos, nosso alcance quanto sociedade e governo é limitado e quase impossível de enxergar e pontuar em tempo real. Existe, porém outra realidade social que, sim, está ao nosso alcance. Existem milhares de crianças que não somente são privadas de relações afetivas seguras, mas se encontram em situação de vulnerabilidade e negligência extrema, assim como sofrem com maus tratos. Essas crianças são normalmente encaminhadas para serviços de acolhimento institucional, como medida protetiva de seus direitos e de sua integridade física. Contudo, tal medida protetiva não supre adequadamente as necessidades afetivas dessas crianças.

Aqui não está sendo tratado a qualidade do acolhimento institucional, mas do formato dele e uma consequência de efeito colateral. No acolhimento institucional não é possível o atendimento afetivo personalizado de cada criança.

A legislação brasileira, no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), contém artigos que garantem o direito da criança e do adolescente viverem em família. Sendo assim, além do serviço de acolhimento institucional, que apesar de adverso em alguns aspectos e ainda necessário, existe também a modalidade de acolhimento familiar, que é apontado como preferencial. Nessa modalidade, o atendimento à criança é feito de forma personalizada e integral por uma família. O acolhimento familiar é um trabalho social ao alcance de qualquer pessoa e família. É uma oportunidade real de atuação cidadã aonde a família abre, além de sua casa, o coração para acolher temporariamente uma criança, até que ela retorne a sua família de origem ou substituta. Ao se abrir dessa forma, a família cria oportunidades para potencializar um futuro diferente para a vida da criança. Essa experiência pode, de fato, moldar um adulto diferente numa sociedade tão carente de reais valores proporcionados pelo afeto.

Semeando amor poderemos colher um mundo com mais amor. Podemos contribuir para a formação de pessoas com suas questões afetivas e emocionais preservadas, desenvolvendo competências básicas para uma vida saudável, para um caminhar mais seguro e com autonomia. É bom que se frise que o amor e o cuidado são aprendidos e vitais à vida humana. Portanto, ensinemos isso no caminhar, doando na prática do dia a dia. Amor é a única coisa que cresce quando se doa.

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